quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O mercado da informação: a notícia como espetáculo


Por Eduardo Almeida, Raoni Souza e Soriel Leiros

Espetáculo: qualquer representação pública que impressiona ou é destinada a impressionar a vista por sua grandeza, cores ou outras qualidades. Esta uma das definições que encontramos nos dicionários acerca do significado de espetáculo. Mas qual o seu real sentido aplicado ao fazer jornalístico?

O filósofo, agitador social e diretor de cinema, Guy Debord, em seu respeitado livro Sociedade do Espetáculo, importante referência nos cursos de Comunicação, aponta algumas questões relevantes sobre este tema. Segundo Debord, “o espetáculo em geral, como inversão concreta da vida, é o movimento autônomo do não-vivo”.

Ainda de acordo com o filósofo francês, “toda a vida das sociedades nas quais reinam as modernas condições de produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos”. Talvez esta opinião só reforce o momento atual do jornalismo, cada vez mais submetido à lógica do consumo e dos interesses dos conglomerados midiáticos.

Textos dinâmicos e o uso de uma linguagem exagerada são as características mais utilizadas em algumas mídias que prezam pelo sensacionalismo, espetáculo ou showrnalismo, termo muito bem utilizado pelo jornalista José Arbex Jr e que se encaixa perfeitamente no formato jornalístico da sociedade contemporânea, independente do suporte em que as notícias são veiculadas. Perde-se a essência do que deveria ser o teor do jornalismo: a notícia de qualidade.

No Brasil, também é comum encontrar na programação das emissoras de rádio e TV e nos textos de impresso e da internet, um jornalismo que não possui a seriedade esperada pelo público. O mestre em comunicação, Jaime Carlos Patias, salienta que “o jornalismo sensacionalista extrai do fato, da notícia, a sua carga emotiva e apelativa e a enaltece”. Além disso, a forma como a notícia é abordada possui uma característica particular neste tipo de transmissão, ou seja, “nesse gênero de jornalismo, o mais importante é a manchete, que faz o leitor ou telespectador ler ou assistir (comprar) apenas por atração, por sensação, por impacto, por curiosidade despertada (...)”, afirma Patias.

No último dia 13 de outubro, fez três anos da morte da estudante Eloá Cristina, de 15 anos. Este caso, ocorrido na cidade de Santo André, teve repercussão a nível nacional e internacional e é considerado o mais longo sequestro em cárcere privado realizado no Estado de São Paulo.

O Caso Eloá é mais um dentre tantos outros tratados pelos meios de comunicação como um verdadeiro “show” atualmente. Nesse momento, é trabalhada a linguagem de todas as formas com o objetivo de persuadir o espectador, pois é através dela que este espectador vai se sentir íntimo, vai se identificar com a situação.

Como a mídia, sedenta por audiência, tentou a todo o custo o furo jornalístico, algo ficou muito evidente neste caso: a concorrência entre os diversos veículos de comunicação. De acordo com a visão de Pedro Gilberto Gomes, doutor em Ciências da Comunicação, o sensacionalismo “consiste em distorcer os fatos mediante a acentuação dos aspectos que provocam reações emocionais, não racionais, na linha de uma exacerbação desproporcional do interesse”. Essa cobertura agregaria mais alguma coisa ao acontecimento? Certamente, não! Mas estava ali, pronta para ser consumida.

O desfecho do caso é conhecido de todos nós: Eloá foi assassinada com um tiro na cabeça pelo ex-namorado, Lindemberg Fernandes Alves, através uma ação mal sucedida da polícia. Nesse momento, a temática da notícia muda completamente. Com o algoz preso e uma opinião popular que busca por culpados, a mídia agora deixa de lado o foco do “show” e apenas lida com os fatos secundários ou as conseqüências que este fato traria para os envolvidos.

A mídia esquece, desse modo, seu limite ético e passa a agir com todas as atribuições inerentes ao poder Legislativo. Toda essa situação não gerou absolutamente nenhum senso critico na população, uma vez que buscou única e exclusivamente o entretenimento; e os desdobramentos do caso não foram suficientes para a criação de leis mais eficazes ou para a própria conscientização de quem recebeu todas estas informações.

O que se propõe quando o assunto é a espetacularização midiática é lidar com um evento que continua atual na nossa sociedade. Deveríamos analisá-la de maneira minuciosa e crítica acerca dos limites moral e ético do jornalismo.

Apurar os fatos e mostrá-los à sociedade é a nossa função como jornalista. A maneira como escolhemos noticiar estes fatos é de nossa inteira responsabilidade, pois trabalhamos com um público bastante heterogêneo, onde o espírito coletivo deve se sobrepor a qualquer interesse particular.

Para saber mais

- “A Sociedade do Espetáculo”, de Guy Debord;

- “Comunicação e sociedade do espetáculo”, de Cláudio Novaes Pinto Coelho e Valdis José de Castro. (capítulo 3 – O espetáculo no telejornal sensacionalista – de Jaime Carlos Patias);

- “Filosofia e Ética da Comunicação na Midiatização da Sociedade”, de Pedro Gilberto Gomes;

- “Manual de Telejornalismo”, de Heródoto Barbeiro e Paulo Rodolfo de Lima;

- “Showrnalismo: a notícia como espetáculo”, de José Arbex Júnior.

Créditos vídeo:

Música: Epica – “Cry For The Moon”

Fotos: Divulgação

4 comentários:

  1. É sabido hoje que o jornalismo vem passando por um período de mercantilização da notícia, processo esse envolvido diretamente com o novo sistema capitalista e com a concentração das empresas jornalisticas nas mãos de poucas pessoas, fomentando o grande conglomerando midiático, levando à tona aquilo que interessa as grandes emissoras, deixando o real sentido do jornalismo de lado, informar a todos o que é de relevância pública.

    José Gabriel Maia da Penha

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  2. O pior disso tudo é saber que, da forma como as coisas estão caminhando, a preocupação da imprensa com o fazer jornalístico só tende a diminuir. Todos os anos casos como esse da Eloá serão espetacularizados pela mídia. Conheço pessoas que já estão comentando frases do tipo "E aí, que tipo de tragédia você acha que vai acontecer em 2012?". É, é realmente uma pena constatar que o exercício jornalístico está "sobrevivendo" apenas através de uma política de pão e circo.

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  3. O problema maior nem é esse, acredito que a manipulação da informação, ocultando o que é de maior relevância pública é o maior mal a ser enfrentado no jornalismo atual.

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  4. A televisão brasileira se condicionou em apenas espetacularizar a notícia. O fato deixa de ser relevância pública e passa a ser um show apresentado em nossas casas. A impressa passa o dia todo mostrando cada passo das pessoas envolvidas no dilema (por exemplo no caso da menina Isabella Nardoni, que a todo momento a mídia estava mostrando tudo o que estava acontecendo com aquela família). Esse tipo de abordagem gera vários conflitos, como na procura pelo furo os jornalistas acabam por não checar de forma correta os fatos.

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